7 de abril de 2011

Crepúsculo

     (Monólogo Harpa, Cena nº 21)


Tenho, ultimamente, me dedicado a leitura em Lygia (Fagundes Telles). E ela diz que: “a beleza não está nem na luz da manhã nem na sombra da noite, está no crepúsculo, nesse meio tom, nessa incerteza”. Bonita essa forma certa de ver o incerto que nutre a cada um de nós em particular!

E hoje, ainda era manhã, quando senti um crepúsculo dentro de mim. Estranho não é mesmo? – o crepúsculo nascer de dia, ainda numa manhã – Mas eu senti o crepúsculo a esta hora do dia. Sentir-me poente e nascente, mistura graciosa de luzes, espaços matizes que o céu pincela!  

Sim, o crepúsculo é o fascíneo instante em que o céu se coloca bem perto ao horizonte, nascendo um poente ou poendo um nascente do qual deriva uma cor degradê que sutila entre o azul do ‘fugaz’ dia e o escuro da ‘eterna’ noite.

Mas, para quem esta repleto de querências e tomado por in-certezas, o crepúsculo parece se formar a qualquer tempo e a qualquer hora em que o tempo se atempora e não se permite medir, permitindo ao humano perceber-se humano não dono de si, mas dono de uma inconstância vontade de ser.   

De repente, tomei-me em meus braços, me abracei tanto que quase não desgrudei de mim.... Era preciso viver este encontro – do ‘meu ser’ com o ‘ser-em-mim’–. E o abraço foi demorado, era preciso que assim fosse, porque eu já estive abaixo da linha do horizonte, já me perdi muitas vezes, deixei-me escapar como água por entre os dedos ou como sol por entre o pôr...

Lembro-me de uma vez que estive em regiões montanhosas e como foi estonteante belo, leve e astuto,  apreciar-me de lá...  É... O crepúsculo também pode acontecer nos caminhos das montanhas, por entre montanhas, para além de montanhas... Para além mar onde os navegadores observam e definem o navegar!

            Eu observei e defini meu navegar!
                        
                  O sol se fez presente mesmo quando imperceptível.      

                       Meu Deus, como é bom crepuscular quando se percebe que:

- Quando pensamos que tudo esta perdido, sem volta, sem tônus, sem calor, sem tesão!, aparece milagrosamente o sol abaixo ou na altura da linha do horizonte e nos diz que tudo passa, redefine, reconfigura, renova, renasce, anuncia!  

- O habitual banho de mar renova-nos dizendo-nos que constelações estão dispostas a iluminar-nos desde que nos permitamos a retornar ao passado somente como lembrança e não como desalento.

- A esperança move a vida íntima, recolhida, ferida, e, acena-nos para a presença de uma magnitude estrelar capaz de minimizar projeções desastrosas nas quais nos colocamos por toda uma vida impulsiva!

Por quanto sol e quanta luz, e, por quanto tempo e quanta hora, demora a existência  de um crepúsculo? Talvez existam muitas respostas em estudos dos mais variados possíveis! Mas em mim não há resposta que agrade, que dê conta de explicar!
Eu não sei explicar o tempo que demora a hora que reluz a luz no solar em mim. Eu não sei! Eu eu não sei! O que sei é que sinto que me conforta, que me mostra a importância do abraço no qual me enlaço, me silencio e me provoco a ser mais ‘eu comigo’ e menos ‘eu contigo’!
Já se foi o tempo em que meu horizonte era apenas marcado pela vista das palmeiras imperiais que estão a minha frente e moram no ambiente no qual sou andarilha! Hoje, meu horizonte é feito por incertas frestas de luz e é mais plausível que aceitar o tudo sempre do ‘mesmo’ jeito sem jeito de ‘igual’ que você quis me plantar!
O que eu quero mesmo é espalhar-me por toda a casa e por toda a vida, tomar a luz em mim refletida e fazer-me ponte para o que desejo, deixando-me ser assim: ‘Sempre no sentir, eterna no acolher, simples no entender, amável para colher o que o crepúsculo me dispuser!’
E, então, amanhecer receptiva para: Receber o tempo, buscar a lamparina para iluminar incertezas e renovar as únicas certezas que ainda tenho - ‘Que a vida é travessia que não termina posto que se renova; é crepúsculo que se põe trazendo o poente que é nascente; e é caminho que milagra sentidos que somente à luz traduz!'    
       

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