16 de abril de 2011

Às Cinco da Tarde

                                                                                                             (Monólogo Harpa, Cena nº 25) 



Às Cinco da Tarde, estávamos lá: Eu, Eu Mesma e Eu Desejo!
Confuso não?! Bem, acredito que é preciso explicar esses três eu’s que teimam em mim habitar!

Eu (essa parte de mim que todos vêem). Eu Mesma (essa parte minha que só revelo a quem me interessa) e Eu Desejo (uma parte de mim que se mostra e se esconde, se oculta e se revela, e, se revela quando mais se oculta).

Nós três, tomávamos o café! E nós conversávamos tanto, mais tanto que não víamos as horas passarem. Para que olhar relógio, marcar o tempo que tão temporal é?! Em cada conversa iniciada, parecia que estávamos construindo uma tese. Uma tese cujo problema central poderia assim ser descrito: Como fazer para sentir-se capaz de viver plenamente as sementes plantadas e retomar caminhos em que se deixou de plantar?

                                       Sabe por que esse é o problema?

Primeiro, porque descobrimos (Eu, Eu mesma e Eu Desejo) que muito se tem plantado e pouco se tem desfrutado. Nem ao menos sabemos se as árvores ainda em sementes dariam flores ou frutos, ou, galhos secos ou vistosos. Plantamos e lá deixamos. Não revisitamos a plantação, para não revisitar o lugar, para não nos revisitar. – Essa talvez seja a maior certeza e a mais triste também – não queremos nos revisitar!

Talvez por medo, timidez, vergonha, desconfiança, baixa estima... Talvez por tudo isso junto o que nos daria uma procura maior ou nos lançaria em precipícios internos esses que ninguém vê mais que às vezes teimam em habitar em nós e se transforma numa eterna tortura.

Em seguida, porque percebemos que o tempo passou e não plantamos. Deixamos para depois e esse depois nunca chegou. Um ‘depois’ preguiçoso que nos fez perder a era dos mosteiros, das catedrais e igrejas, dos castelos e dos mosaicos, das histórias de reis e rainhas, príncipes e princesas, estados de amor!

E o tempo, este senhor sedutor e malvado, foi se misturando em tempo de Deus (na Visão de Voltaire), em tempo de Cosmo (na visão de Kepler), em tempo de Corpo (no sentido da realidade e da metáfora), em tempo de Estado (visão de homem, de mundo, de política, de in-significâncias). Quantos tempos para falar de nós! Quantos tempos perdemos em nós!

Será que não há mais tempo real? Meu tempo de hoje (meu hoje – do meu eu, do eu mesma e do eu desejo) atende pelo nome de Deriva. É objetivo quando me recuo. É subjetivo quando me perco. É absoluto quando não me deixa fluir. É relativo quando me permite apenas ser. É natural quando me revela parte de um todo chamado natureza. É Biológico quando me diz: ‘És ser humano, humanize-se!’

Será que não há mais tempo pontual? Meu tempo de agora (meu agora - tempo do eu, do mesmo, do desejo), atende pelo nome de Instante. É histórico revelando quem sou, onde estou, porque estou! É cíclico porque me faz devir, movimentar-me! É mítico e é cósmico quando me faz ouvir as estrelas e advinhar o áurico sussurar dos sonhos . É cosmológico e astrológico quando me avisa os mistérios do porvir, me faz acreditar em outros mundos nos quais as histórias são contadas de maneiras diferentes.

Será que não há mais tempo seguinte? Meu tempo seguinte (meu seguinte em meu eu e não-eu; do mesmo talvez igual; do desejo qual será? Ainda há tempo?), atende pelo nome de Profético. É estático, é parado; é dinâmico, é volátil quando me reveza, me conserva, me consola, me engole, me (contra)diz..., me anuncia, me reserva, me comprime, me alerta, me faz delirar em mares não visitados, em ondas ainda temidas porque teimama em tomar conta de mim. 

Será que não há mais tempo sentido? Meu tempo sentido (meu sentido é meu eu ressentido, meu mesmo/igual a buscar diferenças; meu desejo repleto de inconstâncias) e atende pelo nome de ‘Estar’. É fractual, é curto, é longo, é negativo é positivo quando me multifaceta, me multicolori, me fragmenta, me faz parte de um todo, me diz ser todo sem aquela parte! Me mostra o relativo no absoluto e absolutiza o que ma faz ser relativo!

Hoje, às Cinco da Tarde... Conversei com as três em mim. Qual delas tem a razão que fere, silencia, emancipa, polariza, invade, condena, absorve, quer explicações, quer deixar para lá as palavras nudas que não querem se expor? Qual delas tem a paixão que atormenta, reveste, se lança e alcança, dorme e acorda, sonha e em entra em pesadelo, chora e sorrir, entoa e destoa, voa e pousa, sente e ressente o pedido que a boca não explorou?!
   
Amanhã, há mesma hora, estaremos lá as três, para continuarmos uma conversa que não tem fim e cujo começo tem dois momentos:

                         O primeiro, que fluiu no tempo ‘presente’ que olha o ‘passado’, faz do ‘passado’ o ‘presente’ e não sente (ou sente, não sei!) as querências da alma em chamas!
                        O segundo, que propôs para o tempo futuro ser ponte e ser fonte nos quais cabem clamor de passagens para que as próximas sementes não sejam deixadas para trás ou jogadas em quaisquer lugares onde não brotam as vontades contidas no desejo e não façam o ser 'Ser um Ausente', provido do 'Hoje' à Deriva, tomado pelo 'Agora' só Instante, agonizando o 'Seguinte' no Profético e calado no 'Sentido' de Estar. 

14 de abril de 2011

Princesa

                                                                         (Monólogo Harpa, Cena nº 24)


Ontem à noite minha última leitura foi em Carlos (Drummond de Andrade). Li com atenção seu poema “O amor antigo” e lá está escrito que: /O amor antigo vive de si mesmo,/ não de cultivo alheio ou de presença./Nada exige nem pede. Nada espera, / mas do destino vão nega a sentença/.

E então, sai da leitura, para entrar em mim, estranha criatura que ainda sonha com o passado a quem dei-lhe o nome de ‘passado próximo’ só para ver se fica mais presente aquilo que já é passado instante, soterrado por lembranças, querências de uma sentença!
E se é antigo, é ainda muito recente, no coração de quem sente, posto que o que é antigo recebe nome de velho e velhice pode até morrer por viver mendigando outro porto! Outro porto onde o sol mesmo antigo, quer e teima ‘viver em-si mesmo’. E não é que isso até que pode acontecer e perdurar por eternidade? E acontece também que é triste saber que o antigo só se conserva nas fotos da estante!
Nada exige e nada pede’! Isso é possível até que ponto?! Exige a presença marcada pela ausência, pede retorno em voz oca de ecos! E espera a esperança se anunciar! Nossa como espera por um destino que te traga ‘o ontem’ para ‘o agora’ e ‘o agora’ para o ‘para-sempre’.    
E o Carlos, continua: /O amor antigo tem raízes fundas, /feitas de sofrimento e de beleza/Por aquelas mergulha no infinito,/e por estas suplanta a natureza./ Neste instante, fechei meus olhos e reservei minha ida as minhas profundezas poços sem chão ou com chão a deriva!
Procurei as raízes, busquei em que terras tu estavas, sai despedindo-me das tristezas, do sofrimento que me impus e lembrando-me das essências que abrigam as belezas, as purezas que ao amor conduz! E infinitamente, sobrecarreguei meu pranto, querendo um manto para cobrir-me, mergulhei em águas claras, mergulhei em cantos tórridos, lágrimas em cristal de sal descendo em sublimes cachoeiras, segurando o ainda terno, doce súplica da natureza para ter tua alma mirando-me!      
Carlos, ainda lembra-me: /Se em toda parte o tempo desmorona/ aquilo que foi grande e deslumbrante, o antigo amor, porém, nunca fenece / e a cada dia surge mais amante./.
E assim foi fortalecendo-me: O amor, o tempo, o que a masmorra não perdoa! Mas torna grande, triunfante o que ali se afeiçoa, em cálido canto de candura que não apodrece, e, ainda cura aquilo que os tornou amantes!
E já no fim, qual fim? Ainda ouço Carlos falar: /Mais ardente, mais pobre de esperança. Mais triste? Não. Ele venceu a dor,/e resplandece no seu canto obscuro, / tanto mais velho quanto mais amor/.
Então, por fim, sentir: É por isso que somos sempre as princesas em nossos sonhos e buscamos os príncipes, os homens gentis, os cavaleiros alados que ao nos encontrar, retiram-nos de grades suspensas; libertam-nos das masmorras, lugares infinitos e perdidos em si; faz-nos sentir especiais e eternas, e, somos infinitas enquanto existimos, e, somos amadas também por bandidos amados, queridos, bem-vindos que nos roubam para nos salvar!
As princesas não precisam acordar! E quando acordam buscam o sono que traga o sonho iniciado posto que acabou antes da hora, antes do tempo se dissipar, antes da estação terminar, antes do “basium", do "Bozk", do "Beso", do "Kiso", do "Baiser"(...) calar-te a boca...
As princesas sempre sentem que o amor vence a dor! Que a dor esvanece-se na saudade. Que a saudade se chama esperança e a esperança se traduz em lembrança d’onde a tristeza somente repousa quando os olhos se abrem!

13 de abril de 2011

Seios

  (Monólogo Harpa, Cena nº 23) 



O Vinicius (de Moraes) disse em uma de suas poesias: “Tomara que a tristeza te convença que a saudade não compensa”. A partir dessa idéia que é quase um sentimento, eu fiquei pensando se vale a pena eu viver brincando de ser feliz, quando a infelicidade me consome e desconsola meu olhar!


Na madrugada desta manhã, chovia pingos de mim em lágrimas de puro sal. Quanto mais chovia em mim mais eu chorava por ti e custei a recuperar-me. Abracei-me muito forte e, de repente, notei meus seios apertados sobre meus abraços e os percebi com saudade de nós!


Não havia uma só madrugada, claridade cálida que acorda o dia, que eu não acordasse com você passando suas mãos por todo meu corpo! E você procura meus seios e tocava de forma leve e intensa e quando eu me dava conta você já estava por completo em mim!


Nas manhãs de qualquer tempo, com mãos em qualquer desassossego, entregava meus lindos seios a doçura de teus lábios tão repletos de ti. Era um amor fora de hora que a hora não se atrevia a contar.


Para que tempo, quando o tempo mais requerido era aquele: Aquele que tuas mãos procuram meus seios, sentindo-os inteiros em gosto de mel. E tuas mãos, nada egoístas, dividiam espaço com tua boca aflita!    


Se tuas mãos procuravam meus seios, tua boca procura meu gosto num gesto caliente e gostoso de onde brotam todo um clamor! Que belo, amor, te perceber presente em mim e dentro de mim...


Nas tardes de qualquer estação, estava você a convidar-me a ‘estar’... Era um estar malicioso, cuidadosamente preparado para não me deixar escapar. Escapar, como? Para quê? E eu queria escapar? Só se fosse Louca, estando longe do juízo perfeito! Só se fosse Santa, estando longe do pecado predileto!


E as tardes demoravam a passar... Acho que elas tinham medo de sentir falta de fôlego quando o pôr do sol começava anunciar a véspera da noite... E, então, a gente tratava de esconder o tempo por entre nossos dedos famintos!


As noites, quando chegavam, delícia de hora esperada, suspiro de alívio em desejo, ali estávamos prontos para recomeçar! Se tínhamos cansaço? Cansaço de quê?! Que cansaço pode ter mãos que procuram corpo, bocas que procuram afeto, no feto chamado seios marca sagrada da mulher?!   


Felizes as mulheres que usam seus seios para acalentar, para desfrutar, para emergir êxtase, para se deixarem tocar, felicitar!!! Os seios de uma mulher sabem e sentem, pronunciam e enunciam o nome do homem que lhe encanta a alma, que lhe seduz à meia luz ou à luz inteira do ousado lugar onde habitam os atalhos e os caminhos dos quereres!


Felizes os homens que sabem o que fazer quando tocam os seios de uma mulher e os levam a boca, e, sabem, ainda, que não podem matar o desejo do corpo nem podem morrer de amor, posto que, se assim fizerem, estarão destruindo a si próprios! E, então, no lugar do “Tomara que a tristeza te convença que a saudade não compensa” Existirá: “Oxalá eu possa voltar para, então, poder desfrutar do que a morte sem pensar me roubou de açoite!


Seios... Dois pedaços de carne, bem moldados, cheios de quenturas, uma loucura da criação... Se Deus não os tivesse feito o que seria dos homens sem seu gozo costumeiro? Morreriam de inanição, prostrados sem explicação, gozando um gozo amargo de imensa solidão!     

E agora, neste momento, não mais estou 'brincando de ser feliz', estou desfrutando a felicidade, consumindo um gozo, uma verdade, cujo consolo repousa nas mãos de um faminto a quem chamo 'Saudade'!

10 de abril de 2011

1/4

                                           (Monólogo Harpa, Cena nº 22)        


Era uma manhã de outono, quando abri metade da janela, um terço de cortina e fiquei te olhando com aquele meio olhar já pensando no convite que iria te lançar!
Admirei-te, admirei-te, enquanto você passava com ‘meias’ passadas, por entre as flores que caíam na sacada da metade ainda velha da casa de tua jovem avó!
E as horas em partes passando, meu fogo então aumentando, querendo tudo queimar... Era um fogo gostoso, com gosto de mais um pouco de um inteiro que faz delirar!
E de vez em quando eu chegava à janela, para ver se seus passos anunciavam você voltando para, então, eu assim, meio sem querer, (muito querendo), a sóis te encontrar!
E foi uma busca gostosa, daquelas que a gente não sente tempo eterno passar, e, se passa não se sente porque não existe sombra quando corpos estão à fresca, procurando brisa para enamorar!
E, então, a noite chegou e eu não vi meia lua, nem lua minguante... Vi, sim, foi o quarto crescente se anunciar no meio de tantas metades sentidas inteiras e queridas que meu corpo pulsava em compasso arrítmico.   
Fiquei esperando você voltar, sair mais uma vez por aquele atalho floral, e, quando você apareceu fiz de tudo para te encontrar, apenas pondo meio corpo uma vez que ali não eram hora nem lugar do corpo todo se amostrar!
E, então, você retornou, apareceu vestido numa metade sensata, com jeito de moço de família daqueles que parecem não pensar nas coisas que o kama Sutra suscita e deseja ensinar!
Diante de tamanha sensatez, timidez, pureza de amedrontar, achei melhor esforçar-me, para te lançar com jeito aquele olhar inteiro querendo te conquistar.
Minha conquista é muito simples, não gosto de passar vontade, ficar com água na boca enquanto a garganta pede saliva para começar!
Então, pensei, que para não te assustar era mais viável propor ‘ousadia’ sem, contudo, nenhuma palavra ou ao menos alguma meia palavra pronunciar.
Fiz-me, então, de tímida! Dei uma de mocinha que 'vê e finge nada visto', que 'ouve e não sabe e nem ouviu', que 'quer e recusa o requerido', que 'mente e sente a não-verdade', que 'faz de tudo para alcançar o que alma reclama e o corpo emana' sem, contudo, revelar o tamanho do demônio – em forma de libido - que em mim habita!   
Fiz-me, então, de misteriosa! Foi bom porque com essa minha maneira expansiva, muito segura de falar, poderia espantar o espantalho amedrontado por não saber por onde e qual lugar começar!
Não falei com palavra alguma nenhuma parte do meu desejar... Mas o pouco que falei, em meio tom, com ritmo em metade, foi o suficiente para emprestar um pouco de silêncio para agora encorajar e então começar!
E então, para minha surpresa, ‘aquela pessoa’ que é ‘seu você’, que nunca se anima a nada, começou a balbuciar um pouco de conversa fiada, palavra comprada em algum almanaque, retirada dos confins dos dicionários, sei lá...
E meus ouvidos ficaram parados, mas não captaram nem parte, nem um terço, nem um quinto do que você falava porque meus olhos procuram à outra metade tua – aquela escondida por entre as roupas que, em parte, diz, e, em parte, nega o que um suspiro inteiro deseja!
Quando percebi que nada ouvi do muito que foi falado, resolvi o tal problema, com um meio sorriso que saiu de meus lábios inteiros com vontade de gargalhar, mas contive a minha louca, quase toda, boca a abrir!
E, então, me lembro muito bem que metade da minha mão tomou teu meio braço e a outra metade de meus dedos tocou de leve tua roupa em pencas (fica zangado não, mas, você parece uma cebola com tantas capas a te cobrir).
E eu só te deixei tocar um terço do meu rosto para ficar com mais gosto de degustar-me em fatias (as fatias requerem cuidado, requerem um jeito especial de servir para que tomemos o sabor intenso dos temperos).
Notei que a tua camisa tinha a metade da manga dobrada e que isto dava a você um charme que me incomodava posto que eu não parava de te medir, hummm, hummm... E sabe que tirar medida a olho nu parece que serve ao fogo que o nu promete?
No meio do caminho, desse ‘olha e não olha’, ‘pega e não pega’, ‘sorrir e não sorrir’, ‘fala e não ouve’, ‘ouve sem falar’... Esses joguinhos que servem para esquentar...
Senti que já era hora de levar-te a um ¼ para que nós dois – tu com tua metade acanhada e eu com meu inteiro 'bem intencionado'-, pudéssemos, enfim, ser apenas o todo das partes que se sustentam em desequilíbrios (rsrsrsrs).
É essa parte que reparte e faz de cada metade a nossa melhor parte, que me faz sentir vontade de encontrar todas as partes nesse pedaço chamado cama, nesse inteiro chamado desejo! 
E agora amor, depois que quase tudo acabou, - apesar de todo esforço (meu) -, não vou perguntar se"Foi bom para você" ou se "Foi bom para mim" porque para mim, ainda está a metade do que um 1/4  promete, em 1/2 luz que reflete a inteira noite de quase madrugada do dia que se anuncia até que aprendamos a nos tomar por completo!