(Monólogo Harpa, Cena nº 22)
Era uma manhã de outono, quando abri metade da janela, um terço de cortina e fiquei te olhando com aquele meio olhar já pensando no convite que iria te lançar!
Admirei-te, admirei-te, enquanto você passava com ‘meias’ passadas, por entre as flores que caíam na sacada da metade ainda velha da casa de tua jovem avó!
E as horas em partes passando, meu fogo então aumentando, querendo tudo queimar... Era um fogo gostoso, com gosto de mais um pouco de um inteiro que faz delirar!
E de vez em quando eu chegava à janela, para ver se seus passos anunciavam você voltando para, então, eu assim, meio sem querer, (muito querendo), a sóis te encontrar!
E foi uma busca gostosa, daquelas que a gente não sente tempo eterno passar, e, se passa não se sente porque não existe sombra quando corpos estão à fresca, procurando brisa para enamorar!
E, então, a noite chegou e eu não vi meia lua, nem lua minguante... Vi, sim, foi o quarto crescente se anunciar no meio de tantas metades sentidas inteiras e queridas que meu corpo pulsava em compasso arrítmico.
Fiquei esperando você voltar, sair mais uma vez por aquele atalho floral, e, quando você apareceu fiz de tudo para te encontrar, apenas pondo meio corpo uma vez que ali não eram hora nem lugar do corpo todo se amostrar!
E, então, você retornou, apareceu vestido numa metade sensata, com jeito de moço de família daqueles que parecem não pensar nas coisas que o kama Sutra suscita e deseja ensinar!
Diante de tamanha sensatez, timidez, pureza de amedrontar, achei melhor esforçar-me, para te lançar com jeito aquele olhar inteiro querendo te conquistar.
Minha conquista é muito simples, não gosto de passar vontade, ficar com água na boca enquanto a garganta pede saliva para começar!
Então, pensei, que para não te assustar era mais viável propor ‘ousadia’ sem, contudo, nenhuma palavra ou ao menos alguma meia palavra pronunciar.
Fiz-me, então, de tímida! Dei uma de mocinha que 'vê e finge nada visto', que 'ouve e não sabe e nem ouviu', que 'quer e recusa o requerido', que 'mente e sente a não-verdade', que 'faz de tudo para alcançar o que alma reclama e o corpo emana' sem, contudo, revelar o tamanho do demônio – em forma de libido - que em mim habita!
Fiz-me, então, de misteriosa! Foi bom porque com essa minha maneira expansiva, muito segura de falar, poderia espantar o espantalho amedrontado por não saber por onde e qual lugar começar!
Não falei com palavra alguma nenhuma parte do meu desejar... Mas o pouco que falei, em meio tom, com ritmo em metade, foi o suficiente para emprestar um pouco de silêncio para agora encorajar e então começar!
E então, para minha surpresa, ‘aquela pessoa’ que é ‘seu você’, que nunca se anima a nada, começou a balbuciar um pouco de conversa fiada, palavra comprada em algum almanaque, retirada dos confins dos dicionários, sei lá...
E meus ouvidos ficaram parados, mas não captaram nem parte, nem um terço, nem um quinto do que você falava porque meus olhos procuram à outra metade tua – aquela escondida por entre as roupas que, em parte, diz, e, em parte, nega o que um suspiro inteiro deseja!
Quando percebi que nada ouvi do muito que foi falado, resolvi o tal problema, com um meio sorriso que saiu de meus lábios inteiros com vontade de gargalhar, mas contive a minha louca, quase toda, boca a abrir!
E, então, me lembro muito bem que metade da minha mão tomou teu meio braço e a outra metade de meus dedos tocou de leve tua roupa em pencas (fica zangado não, mas, você parece uma cebola com tantas capas a te cobrir).
E eu só te deixei tocar um terço do meu rosto para ficar com mais gosto de degustar-me em fatias (as fatias requerem cuidado, requerem um jeito especial de servir para que tomemos o sabor intenso dos temperos).
Notei que a tua camisa tinha a metade da manga dobrada e que isto dava a você um charme que me incomodava posto que eu não parava de te medir, hummm, hummm... E sabe que tirar medida a olho nu parece que serve ao fogo que o nu promete?
No meio do caminho, desse ‘olha e não olha’, ‘pega e não pega’, ‘sorrir e não sorrir’, ‘fala e não ouve’, ‘ouve sem falar’... Esses joguinhos que servem para esquentar...
Senti que já era hora de levar-te a um ¼ para que nós dois – tu com tua metade acanhada e eu com meu inteiro 'bem intencionado'-, pudéssemos, enfim, ser apenas o todo das partes que se sustentam em desequilíbrios (rsrsrsrs).
É essa parte que reparte e faz de cada metade a nossa melhor parte, que me faz sentir vontade de encontrar todas as partes nesse pedaço chamado cama, nesse inteiro chamado desejo!
E agora amor, depois que quase tudo acabou, - apesar de todo esforço (meu) -, não vou perguntar se"Foi bom para você" ou se "Foi bom para mim" porque para mim, ainda está a metade do que um 1/4 promete, em 1/2 luz que reflete a inteira noite de quase madrugada do dia que se anuncia até que aprendamos a nos tomar por completo!
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