2 de março de 2011

Tremi

                                                                                                                         (Monólogo Harpa, Cena nº 9)


Lembro-me como hoje... Foi em um dia de sábado!
Eu estava na porta de casa, conversando com as amigas, quando você chegou e me perguntou se “Eu sabia informar onde ficava a sorveteria?...’’
Eu percebi na hora que aquele enunciado não tinha relação alguma com a enunciação! Suas palavras diziam uma coisa e seu corpo inteiro dizia outra coisa totalmente diferente...   
Estava lá escrito em seus olhos que o que você perguntava era se eu “Não poderia ir ali com você?!’’ Ah! Se essa pergunta tivesse sido feita! Nossa como seria boa a oportunidade de poder ficar um tempinho que fosse contigo!
Mais a pergunta não veio e, portanto, eu não pude responder o que eu e você gostaríamos de ouvir e de sentir... Naquele momento uma tristezinha se aproximou de mim, mas resolvi dá tempo ao tempo entendendo que não faltaria espaço para que você chegasse e ‘nos fizesse’ o convite!
Mais ontem, ontem foi um dia para lá de especial... Você finalmente perguntou o que desejávamos ouvir e as frases um tanto quanto tímidas, trouxeram-nos: "Você gosta de dançar?’’ seguida de ‘‘Você quer sair para dançar comigo amanhã?”. Esse ‘amanhã’, me trouxe uma mistura de paz de espírito, inquietação momentânea, certezas e dúvidas, espera e esperança ...   
Meu corpo tremeu por inteiro! A cabeça imaginou um mundo de coisas, os braços não sabiam se abraçavam você naquela hora ou se esperavam para mais tarde, e, as pernas procurei e não as encontrei! Uma sensação incrível tomou-me por inteiro. É... Isso deve ser felicidade!
Agradeci ao Infinito por estar, naquele momento, junto à árvore frondosa que os funcionários se esqueceram de podar. Nossa aquela copa, daquela árvore, nunca me foi tão desejada! Sabe sombra fresca em um dia de calor intenso?! Foi o que ela me trouxe e eu nem senti que fazia tanto calor assim.     

Depois daquele instante, foi maravilhoso me ver sorrindo para o nada e para o tudo... Nossa como é bom sentir-se desejada como ‘desejamos um sorvete’ nesse tempo de calor ou como ‘desejamos um vinho’ nas noites que prometem olhares e sussurros ou como ‘desejamos ser a música’ para levar o corpo para lugares inimagináveis...
Aqui no trabalho, lugar onde passo a maior parte do meu tempo, encontro muitas pessoas que pagam para saber o motivo do meu sorriso largo, das minhas cantaroladas matinais; do meu ‘bom-dia’ farto e cheio de sabor; da minha incansável condição de fazer as coisas acontecerem; do meu sobe e desce de escadas numa energia de tirar o fôlego de quem acompanha!
É... Perguntam-me o tempo todo qual o motivo de tamanha felicidade e contentamento. Querem saber, jogam o ‘verde’, dão diretas indiretas, são in-discretos, contam histórias que podem suscitar algo em mim e, às vezes, até dizem assim: “Sei não viu, esse batom vermelho...!”, ou então, “Huuuuummmm você está diferente!”, ou ainda, “Aí tem coisa, hora dessas a gente sabe o que é!”...
Mas, por enquanto, nada direi aos "curiosos’’... Quero sentir "sozinha’’ o sabor desse momento! Quero ainda poder sentir, sem ficar igual a um caqui vermelho, toda vez que ouvir tua voz chegando, teus passos entrando na sala, teu telefonema me chamando para falar!
Quero ter o direito de ‘tremer’, deixar meu coração descompassar por segundos que serão horas; perder e achar a voz e, ainda assim, quando usá-la, fazer com tamanha ‘calma’ de arrepiar; colocar o cabelo para trás da orelha buscando o melhor ângulo para que me vejas como eu quero ser vista por você; arranjar a melhor forma de sentar para demonstrar delicadeza, elegância, suavidade. 
Eu sei, eu sei, eu sinto... Toda essa atitude é irmã gêmea da emoção e da ansiedade e tem um nome que resume tudo: Você! E olha, você tem abalado minhas estruturas e estou adorando ver-me assim tão balançada! Meu Deus /tenho sentido/ um "desequilíbrio’’ gostoso que me tira do chão sem que eu faça esforço algum! 
E hoje, hoje é o dia em que sairemos juntos e a sós pela primeira vez... A roupa esta escolhida, o sapato também (e tem que ser vermelho)... Quanto ao perfume vou usar aquele que sempre uso porque tem um cheiro que se confunde com o meu!
Você disse que ligará às 20 horas. Essas 20 horas não poderão demorar a chegar... Esperarei sua ligação cheia de ansiedade... E eu imaginando o ‘oi’ que vou te dizer quando você me ligar perguntando se já estou pronta!; o ‘boa-noite’ que daremos um ao outro, tímido mais muito forte!, o ‘olho no olho’ do jeito que eu gosto e que será para nós dois um convite a um beijo intenso, repleto de nós!
Se eu pudesse adiantaria e atrasaria o relógio – adiantaria, para que o tempo o trouxesse mais rápido para perto de mim, e, atrasaria, para que nunca chegasse a hora de irmos embora... Ah! O Luis (Vaz de Camões) tem razão: “Amor é nunca contentar-se de contente/É um não querer mais que bem querer’’. 
É nesse não contentar-se e bem mais que bem querer que quando me apaixono encontro tempo no tempo; canto músicas em outro idioma; penso que o juízo pode ficar desajuizado; planto flores e vejo sóis em regiões abissais; esqueço que o cansaço faz parte do cotidiano; sinto mel, sem que por perto, existam abelhas; contento-me com um sanduiche na hora do almoço, e, percebo meu corpo trêmulo querendo teus braços para me acolher, sentindo que estou em fogo e, neste fogo, estou presa por vontade’’.

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